Questões da história da Lunda
I- A Terra da Amizade
Poucas regiões de África
terão sido objecto de tantos trabalhos de pesquisa e ensaio das diferentes
disciplinas como a grande região da África Central ligada à bacia do rio Kongo
e aos Rios Kwango e Kasai, cuja caminhada se faz no sentido norte. Descrições
de detalhe sobre os cursos dos rios, sobretudo os nascidos no Alto Cikapa
(Kwango, Kwilo, Luwangue, Cikapa, Ciumbe e Kasai), sua distribuição capilar
pela região e sua relação com a erosão e com a deposição dos principais
sedimentos constituíram objecto de alguns trabalhos de rigor publicados
sobretudo a partir dos primeiros anos do século XX. As características do
território, a sua especial orografia, a deposição das areias do Kalahari, as
zonas de savana e floresta, tem uma relação profunda com a vida e os hábitos
das populações que desde a pré-história ali viveram e criaram cultura. Apesar
da pesquisa sistemática levada a cabo e da descoberta e datação de muitos
sítios de habitação não é possível até hoje criar uma cronologia segura que
ligue os tempos mais antigos aos mais recentes. Há dados e datas para as
ocupações, para o início da produção da cerâmica, para a expansão dos metais,
mas falta uma cartografia de todos os lugares. Analisando os dados é possível
seguir e estabelecer os equilíbrios entre homens e meio desde tempos muito
antigos[1].
Muitas formações políticas e sociais, hoje ligadas a
diferentes geografias, reclamam uma origem histórica relacionada com a Lunda.
As formações sociais das Lundas angolanas[2]também
reclamam um início histórico relacionado com o desenvolvimento do grande
Império Lunda e com a expansão que transformou um conjunto de pequenas chefias
ao longo do Rio Nkalanyi[3] numa
poderosa formação social e política.[4] . O uso
da palavra Lunda coloca sérios problemas cuja extensão não é possível discutir
no âmbito de um trabalho desta natureza. Não é possível falar, quando abordamos
a história, de Lunda Norte e Lunda Sul, mas de conceitos como Lunda, Império
Lunda, Povos Lundanizados. Na documentação portuguesa mais antiga e no quadro
de propostas de travessia de Angola a Moçambique aparece grafada a palavra
“Mozuas” e logo “Moluas” para a seguir se fixar Lunda, traduzida pelos
viajantes do século XIX, por “terra da amizade” -“ nome que tomou da amizade (ruda)
que reinava entre os povos e os chefes dos estados Bungos”[5]. O
conceito ficou e foi crucial no longo processo de negociações ente as potências
coloniais, sobretudo entre os Belgas e os Portugueses (iniciado em 1890-1891) e
os portugueses mantiveram a designação Lunda, para um território
maioritariamente ocupado por formações sociais cokwe. [6]
II No coração do Império
Gerações de especialistas da
palavra, os guardiães da tradição oral, consolidaram núcleos temáticos sobre as
origens que constituem, até aos nossos dias, o referente fundamental e
estruturante das histórias dos povos da região leste de Angola. Núcleos
narrativos sobrevivem independentemente da origem e percurso do informante. As
imagens do passado surgem como articuladoras das coerências do presente e para
a construção dessa imagem contribuem todos os elementos do grupo.
A história da África Central
está ligada à formação e ao desenvolvimento dos povos Lunda e a maioria dos
povos da região articula a sua história de forma a encontrar em aristocratas Lunda
os seus heróis fundadores. A capacidade de converter grupos não lunda em
formações sociais capazes de adoptar as suas instituições está na origem da
expansão dos princípios políticos Lunda durante os séculos XVI e XVII.
Numerosos títulos lunda tornam-se hereditários e os especialistas encontram
diferentes momentos, embora com as dificuldades de estabelecimento de uma
cronologia, nessa expansão relacionada com pressões e crescimento populacional
dentro de um espaço ecologicamente determinado mas respondendo sempre às
alterações que o comércio interior de toda a África vai apresentando em
consonância com as demandas dos seus agentes e intermediários e com a
localização das fontes de fornecimento. A simbologia da realeza, o carácter
sagrado do poder, introduzidos na lunda por invasores luba[7],
perpetua - se entre povos cokwe, mbangala, xinje mesmo que estes não tenham
criado uma estrutura de poder igual à de que era investido o Mwant Yav[8]. A
história da formação do Império Lunda é a história do aparecimento e reforço de
instituições, resultado de um longo processo estendido no tempo e no espaço. Na
origem está a formação de um grande conselho de chefes de terra e o caminho
para uma centralização do poder a partir de regras de sucessão restritas.[9]
A
Henrique de Carvalho, explorador e viajante português que efectuou uma viagem à
capital Lunda entre 1884 e 1887, se deve o mais detalhado relato das origens
míticas do poder entre estes povos. Henrique de Carvalho ouvindo informantes de
várias origens fixou a origem do poder, as questões da sua centralização e
formas de transmissão.[10]
“ Os
Bungos viviam agrupados em diferentes povoações, governando-se
independentemente cada uma com seu chefe, intitulado «senhor do estado», que
tinha por distintivo o Lukano (bracelete
feito de veias humanas)[11]. Os
chefes d’estas povoações eram parentes e todos ouviam e respeitavam o mais
velho, Iala Mácu (ĭala maku «mãe das pedras). Iala, de sua primeira mulher
Cônti, ou Côndi contava dois filhos, Qingúri e Iala e uma filha Luéji, que
tomaram para apelido o nome da mãe.
Os filhos
já adultos tornaram-se ociosos e entregaram-se ao uso imoderado das bebidas
fermentadas, causando desordem e perturbações no estado. (…) Numa ocasião em
que o velho se entretinha, como de costume a fabricar uma esteira no seu pátio
reservado, entraram eles muito embriagados e seguiram direitos ao pai. Os
filhos perturbados pelo malufo (vinho
de palma) começaram a insultar o velho dizendo que os roubava estragando
malufo.
O pai surpreendido
por tal atrevimento e desatino, limitou-se a
levantar os olhos para o mais velho e encolher os ombros. Este
(Quinguri), sem mais demora, levanta o musunhi
(musuni, espécie de cacheira) que trazia, e jogou-lhe uma pancada à cabeça
que o prostrou logo sem lhe dar tempo a
gritar por socorro.
Os filhos
continuaram a insultá-lo e a moê-lo de pancadas com receio de que pudesse
gritar, dizendo-lhe que ele já comera bastante ao estado e devia deixar lugar
para outro, e foi só quando o supuseram sem fala e o viram banhado em sangue
que o deixaram por ali abandonado.
Luéji, recolhendo já tarde do serviço das
lavras com as suas servas, como de costume, procurava o pai para o saudar, e
não o vendo recolhido, seguiu para onde ouvia uns gemidos e ficou surpreendida
com o triste quadro que viu diante de si.
Pouco a
pouco conseguiu saber do pai como os factos se passaram, e deles foi dando
notícia aos parentes que vinham ao seu chamamento. Os parentes mais velhos
entenderam cada um por sua parte mandar participação do ocorrido a todos os
muatas próximos e antes da madrugada já os principais estavam ao lado de Iala
moribundo. Este reconhecendo o seu fim próximo fez aproximar todos para lhe
comunicar as suas vontades. (…) Depois do que se passara pedia a todos os
amigos e parentes que se juntassem e reconhecessem a sua filha como única
herdeira e senhora das terras.(…) Luéji a
Suana Murunda, satisfeita com a tutela no governo do estado, aumentando
pelos do seu conselho, entretinha-se com as suas amilombes no serviço das lavras, apenas comparecia às audiências da
manhã para a resolução das demandas do
povo e negócios do estado, em que confirmava o voto da maioria.
(…) Ilunga, filho de Mutombo, potentado da Luba, logo
que este morreu e depois de ter procedido às cerimónias do óbito, como era um
grande caçador, reuniu todos os seus amigos e dispôs-se a explorar as florestas
do sul e quando chegou às margens do Cajidíxi encontrou as raparigas de Luéji
que se apressaram a informar a Suana Murunda da chegada dos estrangeiros.
Luéji,
consultando os seus oráculos, convenceu-se de que seu pai se encarregara de lhe
enviar aquele caçador e por isso resolveu convocar os cárulas ( na ordem ascendente) para os consultar o que lhe diziam
os adivinhos e sobre o que lhe ditava o coração. Os velhos parentes que já
simpatizavam com o caçador pronunciaram-se a seu favor, porque queriam que se
cumprissem as vontades de Xacala Makala, e estavam sempre temerosos que
Quinguri, conseguisse organizar partido
para roubar o lucano à irmã e tomar conta do estado”. [12]
A tradição recolhida por Henrique de Carvalho conta o
casamento de Luéji e Cibinda Ilunga, a entrega do Lukano (Rukan[13]),
ao caçador e o descontentamento dos ‘irmãos de Luéji’ que resolveram abandonar
a capital do reino. O primeiro a partir foi Cinguri (Cinguli, Quinguri) que
seguiu para ocidente na direcção do mar estando na origem da fundação do Reino
de Kasanje. Outros dissidentes Lunda estariam na origem de estados em
diferentes regiões de Angola:
“ Andumba, era o mais
velho e foi por isso considerado chefe. Estabeleceu-se, pouco mais ou menos,
onde ainda hoje se acha o seu descendente, nas nascentes do Quango; e mais
tarde os seus parentes, não menos ambiciosos que os descendentes do Muatiânvua,
foram-se espalhando daí até ao Cassai até pouco mais de 12º latitude S. do
Equador, constituindo novas tribus sob diversas denominações que tomaram os
rios às margens dos quais se estabeleceram, como são os Angombes, Nungos,
Luenas, Lassas, Cossas, todos conhecidos dos Lundas por Aîoko, nome que até hoje conservam e se pode interpretar por
expatriados. Ná Cabamba Foi a mãe do Primeiro Quissengue, e este deu origem a
um estado que veio constituir mais ao norte de seus parentes (…) por não querer
sujeitar-se ao domínio de Ambumba .
A versão de Carvalho, uma entre as muitas recolhidas
na região, é considerada pela moderna historiografia, uma versão com demasiado
detalhe, talvez resultado da forma como a memória histórica de alguns dos
informantes que o explorador ouviu compuseram a “versão bem comportada da
história”[14]. Elaborado num tempo
anterior à criação dos campos epistemológicos de muitas ciências, este relato é
crucial para o entendimento da modificação das estruturas Lunda, bem como da
sua expansão por um vasto território da África Central. A versão que os actuais
habitantes das Lundas angolanas contam (recolha de campo de 2001, 2002 e 2003)
mantém muitos dos episódios narrativos desta versão de Carvalho.
III História e
ponto de vista
O conceito de antiga pertença, o reconhecimento da
chefia, e a perpetuação de alguns laços sobreviveram aos anos de ocupação
colonial, à descolonização e aos tempos pós independência. Cada um dos
habitantes das regiões em estudo reconhece uma origem comum, tem ideia de um
momento de migração, e das complexas redes de relações políticas que
relacionaram os homens no interior da África Central. Para os povos que habitam
as actuais Lundas angolanas o ponto de vista é essencialmente cokwe, como já o
havia notado, nos anos quarenta do século XX, o antropólogo alemão Hermann
Baumann, sublinhando que todos os Mianangana[15] ou chefes de
aldeia estavam ligados desde a origem em torno do culto dos antepassados e de
árvores simbólicas como as árvores Muyombo[16]. Ainda em Baumann
podemos encontrar a referência à dualidade, masculino/feminino do poder,
central para a compreensão da sociedade cokwe, das ligações matrilineares e
outras questões do parentesco.
O processo de separação das
entidades Lunda e Cokwe foi um longo processo que teve como intervenientes
principais nobres lunda, que perderam a sua língua mas conservaram algumas
instituições e caçadores e ferreiros cokwe completamente independentes uns dos
outros. No final do século XVIII já há notícia da busca de marfim e escravos
por parte destes povos que os comerciantes de Benguela e Caconda consideram
pertencentes aos “souvas Quiboque”, vassalos do poderoso “Souva dos moluas” e
que estes comerciantes consideram “menos velhacos” e desejosos de fazer
negócio. No século XIX são os viajantes que vão dando informações sobre
diferentes formações sociais que cruzam estrategicamente os caminhos do
comércio. Na verdade, a partir do núcleo central do Cibokwe[17]
várias chefias se organizam em pequenas redes comerciais que num primeiro
momento se encarregam de vender marfim e cera e comprar tecidos, armas e
contaria, às grandes caravanas de longa distância organizadas por chefes
ovimbundu e outros africanos ao serviço dos comerciantes da costa angolana. A
particular organização dos cokwe é importante para perceber o seu papel no desenvolvimento
deste comércio do interior de África. A sua organização funcional baseada na
residência, o seu núcleo mais pequeno (Nzovo)[18],
depois alargada à aldeia, numa relação complexa de aliança que pressupõe a
terra e a sua apropriação, bem como a redistribuição dos seus produtos, que
criaram laços muita para lá do quadro restrito do parentesco e restituem a
extrema mobilidade da sociedade assente numa especial organização que permite a
ausência prolongada de membros integrantes da sociedade e ainda o aproveitamento
e a ocupação daqueles que, parentes ou herdeiros do poder, ficavam excluídos do
seu exercício. Não menos importante se torna notar que o papel das mulheres e a
sua valorização no sistema social Cokwe é central a esta possibilidade de
movimentação e manutenção, ao mesmo tempo, da coesão da aldeia assente nos
princípios usoko[19]. A tradição oral
conserva até aos nossos dias o facto de serem as mulheres a ter um papel
fundamental na recolha e preparação da cera, como o terão na manufactura da
borracha[20]. A linhagem materna é
importante e os rapazes cokwe só vivem com os pais até ser sujeitos ao ritual
de passagem ou Mukanda[21] que cria uma
irmandade de sangue e consequentemente elos de ligação entre várias aldeias.
Depois disso e por norma o rapaz passa a viver com o tio materno.
IV Comércio e Vias Comunicantes
As transformações nos padrões
de comércio no interior angolano operam-se de forma lenta até meados do século
XIX, para depois se transformarem quase de ano para ano, obrigando os mianangana (chefes da terra) cokwe a alterar estratégias porque a
gestão de equilíbrios assim o determina. O preço do marfim sobe, o comércio de
escravos apesar de proibido cresce no interior do território. Os intermediários
assumem cada vez mais o papel de protagonistas. É lícito dizer que a partir de
1860 os cokwe deixam de fornecer as caravanas mbangala e ovimbundu para se
tornarem em agentes principais desse comércio do interior cuja malha se estende
e deixa absolutamente de obedecer às exigências das duas grandes vias
transangolanas de comércio. Um tecido de pequenas vias alternativas ou comunicantes
com as vias principais inscreve no espaço a capilaridade de relações
extremamente complexas que transcendem o comércio e tornam as caravanas o
aspecto exterior do continente em
mudança. A proibição do tráfico da costa não impede o seu
recrudescimento no interior e dá lugar a novos actores, novas vias comerciais,
novas redes de intermediários e novas políticas de aliança. Os mercados deslocam-se
mais para o interior e Kassanje perde parte do controlo sobre algumas das redes
comerciais. As pequenas caravanas Cokwe ainda em acção em 1870[22]
deixam de ter apenas o controlo das pequenas redes internas para se tornarem as
maiores e mais importantes caravanas de comércio do interior. A procura de
marfim pressiona este povo para norte e as vias de drenagem das mercadorias,
bem como os mercados multiplicam-se. Os comerciantes cokwe adoptam modelos de
organização caravaneira a partir dos antigos modelos ovimbundu e mbangala e em
apenas alguns anos controlam grandes rotas do tráfico do interior, deles
dependendo caravanas de centenas de carregadores.
Importa referir que toda esta
modificação Cokwe assenta num modelo de “assimilação cultural” que lhes confere
a agilidade necessária a uma ocupação lenta de espaços estratégicos à
sobrevivência e crescimento eficaz durante todo o século XIX. Abertos a todo o
tipo de opções e adaptações estreiam-se num modelo cujo ponto fulcral é a noção
de “equilíbrio oscilante” de que fala Max Gluckmann, citado por Georges
Balandier para combater os radicalismos das noções estáticas sobre as
sociedades africanas[23].
Aqui o que encontramos é uma realidade centrada na dinâmica do crescimento e na
reprodução de um modelo social eficaz. A aliança com os novos grupos através do
casamento é uma prática comum. Progredindo, instalam-se numa área e estabelecem
um protocolo de relações cordiais com os hospedeiros, prestando-lhes serviços.
Alargam as relações com as populações vizinhas e fazem constar as suas
habilidades como caçadores, ferreiros, adivinhos e curandeiros. A progressão
norte que os Cokwe efectuam no século
XIX está em grande parte relacionada com a gestão dos equilíbrios das riquezas
florestais e com as pressões que a mundialização do comércio impõe. A sua estrutura
política e social permite a mudança rápida.
A muitos dos grandes chefes
Lunda se deve o encorajamento da progressão cokwe, uma vez que alguns chefes
lunda contratam caçadores cokwe e iniciam uma política de alianças que
fortalece as instituições cokwe.
Os relatos dos viajantes
dão notícia da progressão cokwe, ao mesmo tempo que introduzem os nomes de
novos chefes e contam da mudança de estratégia para a nova situação de guerra e
conquista. Os nomes ligados à origem Lunda dos “pais fundadores” vão lentamente
desaparecendo para dar lugar a novos e desconhecidos nomes cuja legitimidade se
encontra na guerra, na conquista e ocupação do território. Alguns títulos
centrais para a compreensão do universo cokwe podem ter surgido neste momento
ou ter visto as suas funções valorizadas a partir de meados do século XIX. É o
caso de Cisengue, (Mwant Ciseng) actualmente o mais importante título nas chefias cokwe, considerado
por muitos investigadores como um título relativamente recente na tradição cokwe
: «O conjunto convencional dos principais reis Cokwe (Ndumba, Mbumba, Kanyika e
Kandala) aparece em companhia de um recém-chegado do século XIX- Cisengue»,[24].
Carvalho situa o primeiro Cisengue na descendência de Na Kapamba e a sua origem
nas migrações ocorridas na Lunda depois de Lweji. É ainda Carvalho que diz: «Dos principais descendem Andumba,
Ambumba, Muxico (Quiniama), Miequeta, Quibau, Catende, Canhica, Cabinda,
Miocoto, Quihendo, Cambomba, sendo estes os primeiros que em seguida a
Quisengue se afastaram de Andumba, por causa das exigências de tributos e
receio de feitiços»[25].
Carvalho situa no tempo do Mwant Yav Noéji as primeiras movimentações de
Cisengue para norte.[26]
A Lunda dos Mwant Yav
tinha perdido o controlo e a cobrança do tributo tornava-se cada vez mais
difícil. O sistema tributário continua mas a noção de valor baseada nas
legitimidades da história está substancialmente invertida por alturas de 1890.
Os Cokwe espalham-se por toda a região do Kasai. Os governadores Lunda Mai Munene e Mwata Kumbana sucumbem
à migração Cokwe por volta entre 1887 e 1890. Com a tomada da Mussumba (Musub), capital política do império
Lunda e o exílio do Mwata Yav Mushid (Mushid-a-Mbumb Muteb) em Mutombo Mukulo
(território da actual Republica Democrática do Congo) pode dizer-se que os
Cokwe controlam toda a região do antigo império Lunda.
V O Tempo das Visitas
O
modelo político e económico reconverte-se a favor dos Cokwe durante mais de dez
anos. O Mwant Yav Mushid reorganiza-se e
entra em contacto com o Estado Livre do Congo. É, assim, coincidente a retomada
do poder pelos Lunda com a chegada dos Belgas ao território do Katanga, tendo o
Estado Independente do Congo reconhecido o direito Lunda às terras ocupadas
pelos Cokwe. A intervenção do estado colonial torna-se a partir dos primórdios
do século XX permanente e a organização das companhias, mormente a Companhia do
Kassai vai interferir com os anteriores relacionamentos. O avanço da fronteira
colonial marca e divide os territórios Belgas e Portugueses, embora o fim das movimentações
guerreiras e comerciais dos Cokwe estivesse longe de terminar.
Caravanas
de borracha continuam a sair de certas regiões de Angola, para serem vendidas à
companhia do Kassai, mas os conceitos guerra e comércio alteram-se
substancialmente, as campanhas de ocupação internacionalizam o conflito
sobretudo depois da descoberta dos diamantes na região. Alianças são
estabelecidas entre africanos e europeus para combater os Cokwe, tendo os
Belgas reconhecido os direitos dos Lunda às suas “terras ancestrais”, uma vez
que o controlo colonial efectivo só muito depois da Criação do Estado Livre do
Congo tem lugar. A construção dos diferentes estados coloniais na região,
estreitamente ligados aos interesses mineiros, trouxe diversas políticas de
ocupação e relacionamento com as autoridades tradicionais. O crescimento das
indústrias mineiras e as necessidades de mão-de-obra relacionam-se directamente
com o problema da procura de trabalho barato e produtos rurais para suster a
alimentação dos trabalhadores. Nas regiões subordinadas à política inglesa, a
então Rodésia do Norte e à exploração belga, uma legislação aparece para
regulamentar as relações entre os representantes das autoridades coloniais e as
populações. Em alguns locais a aplicação da actuação do “Indirect Rule”[27]
não foi seguida pelos administradores locais, partidários de uma política mais
centralizadora, e foi, por vezes, contestada pelos missionários católicos que
defendiam a política de assimilação[28]
As estruturas
políticas pré-coloniais foram objecto de perseguição e muitas vezes destruídas
durante o período de “pacificação” para depois se assistir a um processo de
nomeação e escolha de alguns chefes que David Gordon[29], num
estudo sobre a então Rodésia do Norte e Congo Belga considera os “Chefs
médaillés” aos quais foram, atribuídas algumas tarefas dentro do quadro da nova
administração colonial. Um decreto de 1891, do tempo de Leopoldo, já reconhecia
algumas dessas chefias, em alguns territórios, destinadas ao papel de
mediadores entre a administração colonial e as comunidades africanas. Uma
dualidade e várias ambiguidades transparecem na documentação existente sobre
este assunto marcadas por um crescente aumento dos poderes dos chefes nomeados
independentemente do que nas aldeias e nas zonas rurais se passava com os
chefes reconhecidos pelas comunidades. Muitos administradores das colónias
preocuparam-se mesmo em investigar genealogias pré-coloniais numa tentativa de
legitimar um processo de ligação dos novos chefes às origens fundadoras do império
Lunda. Há que ter em conta, no entanto que a produção do poder, depende dos
diferentes padrões de conquista e das diferentes formas da presença colonial.
David Gordon considera que na então Rodésia do Norte o comportamento britânico
é de distância (“dispersive british administrativ presence) permitindo mesmo um
processo de reconsolidação de chefias com raízes históricas e legitimidades
conhecidas[30].
A política
portuguesa foi de carácter substantivamente diferente, embora a ideia do
“diálogo” com as autoridades tradicionais chegasse a estar presente em
disposições legais:
“Em antigas disposições legais, principalmente um dos mais ilustres
ministros da pasta do Ultramar, como foi Sá da Bandeira, preceituava-se que os
sobas e potentados indígenas fossem aproveitados como representantes da nossa
autoridade dentro dos seus estados, dando-se o seu apoio à sua suserania sobre
os seus vassalos, e ao mesmo tempo aproveitando-a em benefício dos nossos
interesses”[31]
diz-se, num trabalho de 1912, que culpa os militares de
“se arrogarem o direito de substituírem os chefes indígenas”. Os códigos,
estatutos e regulamentos que se sucederam (1900-1960), criando figuras legais
para “protecção aos indígenas” retiram a uma parte significativa das populações
africanas o estatuto de cidadãos e na sequência os direitos à posse privada das
terras. O reconhecimento de algumas das autoridades tradicionais baseou-se
sempre na possibilidade de obtenção de colaboração por parte destes chefes. [32] A
legislação colonial fala em “sobas”[33],
“regedores” rasurando particularismos e funções específicas de cada povo e
região sobre a qual legislava.
Os tratados
de vassalagem e o reconhecimento dos chefes africanos presentes em protocolos
anteriores (ainda no século XIX e primeiros anos do século XX) desaparecem
depois da ocupação militar e estão ausentes da política de produção dos novos
espaços das companhias mineiras, PEMA e DIAMANG, a operar no território em
estudo:
Uma
coisa interessante. Quando começou a exploração de diamantes a partir de
1912/1913, a Diamang uma das coisas mais interessantes que fez foi estudar
muito bem estes povos para melhor governar. O que é que se passou? Houve uma
certa duplicidade em termos de poder. Todos os sobas que se encontravam nas áreas
de exploração. Esses sobas não são verdadeiros sobas. Vieram de outros
sítios...
Quando chegaram aqui a Diamang começou a indicar um
capita e eles se tornaram sobas elos de ligação entre a comunidade e a Diamang
, É quando uns que saíram do Moxico vieram. Ali onde saíram eram da linhagem
dos sobas ou não eram. Mas quando chegaram aqui a Diamang escolhe um terreno.
Vão construir aqui e um deles vai tornar-se soba. Falando de duplicidade.
Quando o tal soba regressa na cidade natal não regressa como soba. Hoje são
legitimamente reconhecidos. As leis da linhagem funcionam para esses sobas”[34].
A questão dos
poderes e da relação das autoridades coloniais com os poderes locais é uma
delicada questão que atravessa toda a histórias das relações luso-africanas desde
o século XVI. O momento da Diamang para o qual nos remete a entrevista acima
citada é um momento de viragem importante balançado pela consolidação das
estruturas de pesquisa mineira, o alargamento e a tomada de posse de um
território muitas vezes coincidente com os territórios de antigas chefias cokwe
ou lwena. Ao mesmo tempo as contingências da moderna política colonial tinham
transformado todo o território destas antigas formações em territórios de
fronteira de três impérios coloniais. A demarcação das fronteiras está em
processo desde 1891 e desde essa data estão no terreno representantes do Estado
Independente do Congo com o missionário George Grenfell a chefiar a missão pelo
lado do Rei Leopoldo e Simão Cândido Sarmento, major do exército português a
representar Portugal. Desta missão resulta a carta conhecida na documentação
por “Carta de Grenfell ─ Sarmento” que se constituirá
ponto de partida para as missões seguintes e a discussão e as divergências
entre certos traçados da fronteira (região Uambo-Combo), na origem de abundante
correspondência entre o Ministério dos Negócios Estrangeiros Belga e o
Ministério dos negócios estrangeiros Português. Uma comissão arbitral é
primeiro sugerida e depois nomeada. [35]
Guarnições de
fronteira rapidamente adoptam comportamentos que mimam episódios da história
africana da região dos finais do século XIX. Razias, construção de postos
fortificados, recrutamento de africanos para funções de vigilância (capitas e
cipaios). Certas tradições locais recordam esses tempos como a “idade das
visitas”[36]. Fenómenos de fronteira
são contemporâneos de modificações dentro das sociedades ao mesmo tempo que os
primeiros dispositivos e agentes da sociedade colonial estão em campo e fazem
mudar a dorsal do comércio, agora mais dependente de fluxos migratórios que as
acções militares e de cobrança dos impostos provocam. Dentro de uma mesma
unidade territorial coexistem e relacionam-se “temporalidades discordantes”[37],
visões da história e do passado de formações diferentes.
A entrada do
capital e a constituição da maioria das empresas são operações planificadas que
seguem a par com a ocupação militar e administrativa provocando por vezes
migrações em massa das populações que se recusam às novas condições de trabalho
e ao pagamento de impostos. Novos desequilíbrios e a introdução do conceito de
“zona rural” em contraponto com as zonas de acampamento junto das minas e as
futuras cidades começam a realizar-se[38], não
sendo, depois de 1900 possível analisar as questões ligadas ao fenómeno da mão
– de -obra sem ser no quadro da análise dos problemas criados pela
transferência de força de trabalho das aldeias para os grandes centros de
recrutamento e utilização da mão –de - obra. Os mundos fechados[39] das
empresas longe dos lugares de fundação operam modificações do espaço que
produzem ecos significantes nos seus anteriores habitantes.
Os poderes
coloniais prestam-se, por vezes, no terreno, a operações de levantamento dos
lugares que a memória local reconhece como importantes numa tentativa de
legitimar novas ocupações ou o regresso de determinadas formações sociais e
políticas aos lugares de ocupação antiga, abandonados na sequência das
transformações ocorridas na África Central durante as duas últimas décadas do
século XIX. Procuram conhecer a “história” das estruturas políticas e sociais
dominantes para as legitimar. A documentação Belga e Portuguesa coeva está
cheia de noções como “terras ancestrais” “regresso às terras ancestrais”[40]. O
problema percorre os primeiros anos do século XX como se aduz da carta de
Norton de Matos[41] dirigida ao governador do
Congo Belga em 17 de Abril de 1922 solicitando, em nome da “orientação geral
dos dois governos do Congo Belga e Angola... orientação de mútua cooperação e
de comum esforço em tudo que represente civilização e progresso” um
entendimento afim de evitar que “os rebeldes se refugiem no Congo Belga”[42]. As
minas exigiam força de trabalho.
Entre 1910 e
1912 as minas do Katanga estão em pleno desenvolvimento e para tal urgia criar
bolsas de trabalho. O recrutamento muda-se para o Kassai e para Angola, sendo
que as autoridades belgas pretendiam um acordo com Angola semelhante ao já
existente entre a Witwatersrand Nativ Labour Association (WNLA) e Moçambique[43]. O
fenómeno de mundialização do colonialismo obriga ao estudo de outras
experiências coloniais para pôr em prática determinadas medidas.
O poder
colonial consciente das modificações internas ocorridas na maioria dos estados
africanos pertencentes à zona da Bacia do Kongo e regiões limítrofes procede a
operações de reconhecimento dos chefes que apoda de legítimos não hesitando no
caso da região Luba (por exemplo) em ligar alguns novos chefes à instituição
Bulopwe (O sangue sagrado das origens)[44].Apesar
dos sistemas de dominação as sociedades africanas conservaram a sua mobilidade,
o seu carácter policêntrico e a sua capacidade de reconstituição das
referências identitárias que estão na origem de formações futuras e da
habilidade para escapar ao controlo colonial quer pela oposição aberta quer
pela fuga. A memória colectiva (no sentido em que Halbwachs a
define[45])
conserva até aos nossos dias o abandono das minas por trabalhadores de certas
regiões na altura dos ciclos do mel e da cera.
VI Mundos
Fechados
A história do século XX está para as regiões em estudo ligada à
descoberta dos diamantes e à criação das grandes companhias de exploração
portuguesas e belgas. Não estão descritas pela literatura, nem a tradição oral
conserva a memória de exploração e posse de minas de diamantes para os povos das
regiões em estudo. As
complexas relações dos povos desta região com a terra a clara definição dos
seus princípios ligada às formulações sobre o mundo dos antepassados passam ao
lado da sua utilização, num tempo histórico anterior a 1906, da sua utilização
como lugar de extracção e garimpo.
A história dos Diamantes e da
Lunda estão profundamente ligadas às acções de prospecção do território e à
descoberta em 1906 de diamantes na bacia do rio Cikapa[46]. O
conhecimento muda a partir da fase da
prospecção e significa a perda de
controlo da informação e posse do território até aí exclusiva pertença dos
povos locais. Foram geólogos contratados pela Forminiére[47] que, em 1912, descobriram o primeiro diamante
em território de Angola, no ribeiro Musualala, afluente da margem direita do
Ciumbe, não longe da actual fronteira entre Angola e a Republica Democrática do
Congo.
A descoberta dos diamantes e
as características dos depósitos encontrados inaugura para a região a relação complexa entre mineração,
força de trabalho e os fenómenos presença, ausência de trabalhadores, o
recrutamento, impostos e novas ideias sobre a colonização do território.
Projectos anteriores apontavam para uma colonização centrada na ocupação
militar do território e a sua exploração agrícola, nunca pondo de parte as
possibilidades de descoberta de ouro e cobre. Os
trabalhos de prospecção da Forminiére
e a descoberta dos diamantes provocaram a constituição, em 4 de Setembro de
1912, da PEMA-Companhia de Pesquisas Mineiras de Angola[48],
sociedade anónima de responsabilidade limitada com o objectivo de realizar em
Angola, noutras colónias e noutras partes do mundo todas as operações mineiras,
agrícolas, industriais e financeiras desde que permitida pelas leis dos países
respectivos. As características da companhia permitiam o trabalho de prospecção
como contínuo numa vasta área sem delimitação de fronteiras assente nos
princípios de que a literatura colonial se faz eco de se tratar de uma terra de
ninguém a Lunda como entidade geográfica e política oferece terreno para
análise dos fundamentos do estado colonial e da sua maior ou menor presença a
nível local[49] .
A companhia inaugura uma
estratégia que combina conhecimento, experiência e dominação, elementos de
perturbação e alteração da vida das populações locais que reagem desde o início
pela fuga ou pela guerra.[50] Como
foi referido anteriormente a questão da violência assume aqui contornos que não
se limitam ao confronto directo geralmente tratados como ocupação versus
resistência na literatura histórica de várias épocas. A guerra é um facto para
ser entendido na longa duração e pode ser analisado como uma pulsão para a
formação de novas estruturas sociais que reproduzem e renovam as antigas de
forma a assegurar a sua permanência no tempo e sobrevivência ao confronto com
novas políticas.[51] Os centros da guerra
mudam, como muda a forma de a encarar e tratar por parte dos seus principais
intervenientes. A violência do confronto desencadeia respostas que constituem
«técnicas de ajuste social: os códigos, as regras, as operações simbólicas e
rituais, o direito»[52].
A documentação fornece-nos
muitos exemplos do que foi incluído na categoria guerra ou insubmissão que por
ser semanticamente mais lata é usada para conter conflitos de sucessão,
autoridades locais, gado, pagamento de portagens, impostos, recrutamento,
trabalho contratado e assalariado. A «pax colonial» de que a companhia se faz
promotora inaugura o tempo do controlo em vez da abolição do conflito. Cumpre
chamar a atenção para o delineamento de uma estratégia que joga com a
localização dos conflitos em zonas próximas das minas e com a necessidade de
envolver no assunto as autoridades belgas. As informações demonstram ainda
alguma insegurança no conhecimento da região, do poder real dos chefes locais e
da atitude a tomar quanto à frequente passagem das populações de um lado para o
outro da fronteira.
A confirmação da viabilidade
e da importância económica da exploração dos diamantes de Angola deu lugar a
que a Pema e algumas das suas associadas promovessem a constituição de uma
sociedade anónima de responsabilidade limitada a Companhia de Diamantes de
Angola[53].
A história da região leste de
Angola é também e sobretudo a partir da instalação das primeiras prospecções
mineiras, a história do trabalho, com todos os problemas da sua
conceitualização, da relação com a legislação colonial e dos diferentes regimes
de contratação. Um primeiro problema que se coloca quando se trata de
mão-de-obra é a questão de a encontrar[54],
sobretudo quando o que se tinha em vista era obter mão-de-obra barata e
disciplinada. A região aos olhos dos prospectores e primeiros europeus
encarregues de criar o espaço das companhias era vista como uma região
desabitada, hostil e rebelde. A ideia de criar uma população residente
‘importada’ de outras regiões da colónia é cara aos responsáveis da companhia e
atravessa toda a documentação trocada entre os representantes da empresa em
Angola, a sede em Lisboa e as representações em Londres e Bruxelas.
Um
relatório do representante da companhia, de 1929, resume assim o problema:
“Realizou-se assim, em parte, uma das
velhas aspirações da Diamang, que era a de colonizar a região das minas com
indígenas de outros distritos...
Essa ideia, já antiga de bastantes anos
tinha tido origem em dois motivos. Um deles era o aumento da população da
região. O outro era o de opor à grande massa de Quiocos insubmissos e rebeldes
que povoam a região das minas, núcleos importantes de indígenas de raça
diferente que em caso de revolta pudesse contê-los em respeito, ou mesmo
absorção ou repulsão, fosse integrando em si parte dos elementos quiocos e
afastando para longe a parte não integrável ou assimilável aos hábitos de
trabalho, tão pouco características daquela raça de guerreiros e caçadores que
do sul tinham vindo a expandir-se pela Lunda adentro ocupando terras e
avassalando escravos”[55].
Os primeiros anos de exploração envolvem portanto as
questões do trabalho (discussão em torno do contrato[56]), e
das categorias de trabalhadores a empregar, da mobilização de todo o trabalho
disponível, por exemplo o trabalho das mulheres e das crianças, a baixo custo,
alimentação e saúde dos trabalhadores. Dos relatórios passam a constar os
números de trabalhadores contratados divididos nas categorias de ‘brancos e
indígenas’.
Quadro nº 1
ANOS
|
TRABALHADORES
BRANCOS
|
TRABALHADORES
INDÍGENAS
|
OBS.
|
1918
|
11
|
921
|
|
1919
|
16
|
1831
|
|
1920
|
28
|
4500
|
|
1921
|
46
|
5104
|
|
1922
|
67
|
5.104
|
Instabilidade
de mão-de-obra, abandono das culturas
|
1923
|
63
|
3.143
|
Os
números não coincidem com os do relatório da Direcção no Dundo. Insuficiência
e instabilidade da mão-de-obra. A direcção afirma que as providências
adoptadas e a adoptar levarão à fixação gradual, na região das minas, de uma
população residente proveniente de outras regiões da colónia.
|
1924
|
73
|
3659
|
|
1925
|
96
|
3758
|
|
1926
|
109
|
4535
|
O
vol. Médio de cascalho removido p/trabalhador/mês é de 6,
|
1927
|
135
|
6243
|
|
1928
|
130
|
5511
|
Vol.
médio de cascalho,
|
1929
|
109
|
4712
|
Vol
médio de cascalho
|
1930
|
121
|
4895
|
Vol
médio de cascalho, 9,
|
1931
|
122
|
4988
|
|
1932
|
107
|
5285
|
*
|
1933
|
100
|
5011
|
Vol
médio de cascalho
|
1934
|
107
|
5765
|
Vol
médio de cascalho
|
1935
|
125
|
7233
|
|
1936
|
140
|
8954
|
|
1937
|
156
|
11156
|
|
1938
|
175
|
10260
|
|
1939
|
166
|
9923
|
|
Fontes: Relatórios do Conselho de
Administração (1917-1940) e Rapport de la Direction Technique
de 1939.
*O
relatório de Brandão de Mello referente ao ano de 1932 apresenta a diferença
entre trabalhadores voluntários 4703 e contratados 2381(Fundo MUC, cx. 202.
De notar que estão fora deste
quadro uma quantidade substancial de mão-de-obra mobilizada pela companhia mas
não contratada por ela. Assim dos quadros não constam os camponeses
fornecedores de alimentos e ainda de trabalhadores não especializados, pequenos
artesãos que começam a gravitar em torno do trabalho das minas, abertura de
estradas e outras vias de comunicação. As mulheres estão fora das estatísticas,
mas a companhia deita mão de uma série de medidas para captar esta força de
trabalho que podia trabalhar nas quintas familiares (os excedentes eram
comprados pela companhia) e também integradas nas ‘granjas’ da própria
companhia.
Durante os primeiros vinte
anos de vida da companhia, muitas são as medidas para captar a vinda de
mulheres para a região: oferta de panos, pagamento adiantado de dois anos de
imposto do contratado e reforço da alimentação do mesmo durante a viagem de ida
e volta. Pretendia-se fixar gente na região das minas. Porém, a Companhia não
contou ou não soube ver os complexos problemas da dupla ligação das mulheres a
um espaço (o espaço de cultivo nas suas terra natais) e a uma família da qual
constituíam o garante e a legitimidade. Não é demais pensar que as autoridades
coloniais das diferentes localidades terão também oferecido a sua resistência,
uma vez que o trabalho das mulheres era capital para a abertura de estradas, a
desmatação e a capina das regiões. No entanto, e através de demoradas
negociações, a Companhia foi conseguindo a contratação de trabalhadores com as
respectivas famílias[57].
O quadro dos equilíbrios
internos das sociedades africanas, com a permanência das mulheres nas zonas de
origem dos trabalhadores, é assim frequentemente rompido pelas pressões a que
as mesmas se encontram sujeitas: mobilização dos homens, obrigatoriedade de
pagamento dos impostos e propaganda dos agentes angariadores. No entanto, e
mesmo nas regiões demarcadas pela Diamang para a agricultura, as condições das
relações não capitalistas de produção prevalecem e os dois sistemas
(capitalista e ‘tradicional’) coincidem no espaço e no tempo, ultrapassando em
muito a exploração mineira e agregando significados em relação às áreas de
terra demarcadas para serem directamente exploradas pela Companhia. Ainda
assim, surge uma discussão em relação à posse da terra, uma vez que por lei a
empresa tinha que respeitar um certo espaço à volta dos aldeamentos locais. De
novo o discurso sobre o povoamento esparso e as zonas desertas serve os
interesses da companhia. Serve ainda a política da companhia na contratação de
trabalhadores de outras regiões de Angola a insistência na incapacidade dos
trabalhadores lunda para o trabalho e
no facto dos trabalhadores cokwe continuarem ‘rebeldes’ ao trabalho por
o considerarem menor e próprio de contratados.
Os problemas com a alimentação dos
trabalhadores, bem como os altos índices de morbilidade e mortalidade, passam
resumidamente nos relatórios dos representantes em Angola e são tratados com
maior detalhe na correspondência e relatos enviados para Bruxelas[58]. A
legislação prevê inspecção sanitária, tratamentos preventivos, como a
obrigatoriedade das vacinas (anti–variólica e contra a febre tifóide), mas,
antes de 1930, não se pode falar de uma política de saúde pública aplicada pela
Companhia. Depois dessa data, a selecção torna-se mais rigorosa, passando a
aplicar-se o índice de Pignet[59] e
tentando-se solucionar o problema da alimentação com o aproveitamento dos
víveres produzidos nas terras da Companhia: “Ainda em relação à mão-de-obra
indígena e com o intuito de facilitar à Companhia a aquisição dos víveres
necessários para os seus trabalhadores, S. Exª o Alto-comissário deu instruções
telegráficas ao Governador da Lunda para pouco a pouco ir obrigando os quiocos
a produzir géneros alimentícios”[60]. Esta
determinação, consequência de negociações levadas a cabo pela companhia, mostra
a importância que os víveres produzidos localmente tinham na alimentação dos
trabalhadores. Estudos para substituir na dieta aprovada alguns produtos por
outros de origem local são levados a cabo pelos médicos da Companhia[61]. O
amendoim (ginguba) é fornecido e o milho transforma-se em cultura obrigatória
depois dos anos quarenta.
Podemos dizer que a partir
desta época a paisagem física e cultural da região está profundamente
modificada em grande parte por acção da Companhia e das relações de ambiguidade
estabelecidas com os governos da província e seus representantes a nível local.
A política de fixação das
populações prevista pela Companhia é um processo lento, explicado pelas
condições de trabalho, pela falta de incentivos, mesmo salariais, pelo trabalho
das minas considerado violento e, muitas vezes, tentado como forma de punição.
Vale lembrar que, depois da revolta de 1940, sucessivas levas de prisioneiros
Cuvale são enviados para as minas[62] e
muitos outros para aí vão quando capturados pelas autoridades administrativas
por falta de pagamento dos impostos. A originalidade e as condições únicas dos
regulamentos e dos sucessivos contratos entre a empresa e o estado colonial permitem
o suprimento de mão-de-obra nos contingentes necessários. Mecanismos de pressão
conduziram ao processo de assalariamento, que foi, para a região, muito tardio.
Não é possível perceber a história do trabalho sem ter em conta os mecanismos
de recrutamento ensaiados e o respaldo que a companhia sempre colheu das
autoridades administrativas, as quais, por sua vez, exerceram todo o tipo de
pressões sobre as autoridades tradicionais. A Diamang tornou-se num dos maiores
empregadores de Angola e isso a foi obrigando a tomar medidas respeitantes à
higiene e à saúde dos trabalhadores, tornando-se esta política num dos aspectos
que conferiu ao longo dos anos maior visibilidade ao trabalho da empresa.
VII Discurso para fora
Passa por aí o discurso para fora ensaiado pela
companhia desde os primeiros anos (missão pacificadora e civilizadora) e que
cria um enorme ruído, olhado de forma desconfiada por outros agentes do
colonialismo português[63] e
criticado pelo sociólogo brasileiro Gilberto Freyre que visita a companhia em 1951 e no seu livro Aventura e Rotina, diz sobre a Diamang:
“Tem-se aqui na verdade, um conforto
profilático e quase clínico... Vida de indivíduos que para, não de deixarem
contaminar por ambientes tropicais, vivessem como doentes ricos em hospitais e
casas de saúde. Vida artificial. É o que mais sinto ao chegar ao Dundo, sob a
iluminação festiva e ao mesmo tempo, clínica e policial, com que a sede da
Companhia de Diamantes nos recebe.
Policial
porque o Dundo vive ─ e precisa viver ─ em estado permanente de defesa, não só
contra as doenças tropicais que possam
fazer mal aos seus técnicos ou funcionários brancos, que vivem aqui com as suas
famílias vida quase quimicamente pura, como contra possíveis ladrões de
diamantes que pudessem aproveitar-se das sombras normais da noite, do escuro
das noites tropicais, para investidas contra os cofres em que se guardam
centenas e centenas de diamantes”[64].
Esta publicação desencadeia entre outras uma
crítica acerada do Comandante Ernesto Vilhena, Director da companhia de
Diamantes de Angola, que desvaloriza a importância do livro de Gilberto Freyre
“está longe do Monumental Trabalho de Casa
Grande & Senzala”[65] e acusa o sociólogo brasileiro de não ter
percebido os objectivos da Companhia. Aponta sobretudo para o facto de que:
“Freyre esquece, ou não chegou a
perceber, que não se encontra numa simples vila ou lugar habitado de Angola,
mas no centro de uma grande empresa industrial, amplíssima nos seus objectivos
e na área em que presentemente actua (30.000Km; quase um terço de Portugal
Continental) com uma população de 80000 almas, verdadeira «torre de comando» e
centro vital de uma organização em que trabalham 332 europeus (acompanhados por
417 mulheres e crianças) e cerca de 17000 indígenas, reunidos e organizados com
vista a um objectivo bem determinado, que é o de extrair diamantes, em
condições de boa administração e de economia, que permitam retribuir o capital
investido no empreendimento”[66] .
Este é
o discurso da companhia, a sua argumentação de legitimidade, presente nos
relatórios, artigos de jornal, participação nas efemérides portuguesas. O
discurso procura traçar as suas linhas numa teoria do «colonialismo científico»
cujas bases cruzam conhecimento e apropriação do conhecimento com modificação e
implantação de modelos de assimilação cultural e mudança. O museu, cujas
primeiras colecções datam de 1936[67],
procura trabalhar segundo a definição de áreas
científicas que combinam a geologia, a arqueologia, a etnografia e a
história (da Lunda e da Diamang). Os princípios articulam-se numa definição
científica das diferentes ciências cujos campos epistemológicos concorrem para
criar um arquivo da história da região. As campanhas aos lugares de origem dos
povos da região são como viagens ao passado para reconstituir percursos e
salvar para a posteridade um tempo em mudança por acção da companhia. O museu e
as publicações culturais (o primeiro número é publicado em 1946) são os marcos
distintivos da companhia que deseja um discurso de legitimação para dentro (os
sobas da região são chamados a colaborar no museu, a aldeia museu promove
festas regulares de celebração da cultura, artesãos são pagos para trabalhar
junto ao museu) e um discurso para fora: a celebração da ciência que faz com
que a companhia convide grandes especialistas do mundo (arqueólogos, estudiosos
da “arte negra”) para legitimar e fundamentar os seus trabalhos. Cumpre chamar
aqui a atenção para o processo de estranhamento que se inaugura com a abertura
do museu à visita dos habitantes da região. Os relatórios do Museu fornecem
informação sobre fuga (até de trabalhadores e guardas do museu) e interditos. A
integração do museu na vida quotidiana das populações é um processo longo que
se traduz hoje na ideia “dele (o museu) ter sido uma “coisa grande” que
entretanto, se perdeu.
VIII Histórias do presente
Depois da proclamação da
Independência Nacional, a história da região Lunda é a história da reconversão
ideológica e política dos povos a um modelo económico diferente, da sua relação
com as novas estruturas do estado que
surgem, com a ausência de uma companhia
que a Endiama[68] não substitui e com uma crescente dolarização da economia e seus
mundos fechados e a abertos. O diamante torna-se central na vida dos habitantes
da região sendo importante notar que esta extracção e comércio não seguem as
mesmas linhas das anteriores rotas do comércio caravaneiro. São outros os
agentes e intermediários e o factor guerra introduz novas obrigações.[69]. As
zonas tradicionais de mercado são outras assim como as regras que pautam o novo
comércio. A vinda de numerosos agentes estrangeiros, igrejas, alteram
substancialmente a vida das populações da Lunda. Novas situações de
empobrecimento levam as populações a viver na órbita do diamante, o que implica
a mobilização dos jovens para o garimpo em busca da “Lubóia” ou seja a grande pedra a pedra da salvação[70].
O passado mais antigo é
relembrado como horizonte mítico e estruturador da identidade e o mais recente
situa-se na zona ambígua da libertação e da saudade. Por um lado é importante
não haver trabalho forçado, por outro lado a nova guerra trouxe a morte de
autoridades importantes, a necessidade de fuga permanente e a falta de escola e
serviços de saúde. O passado contido na memória é dinâmico e tende a rasurar
algumas questões para enfatizar outras.
A história da memória colectiva
faz-se da interferência de testemunhos individuais e pode ser retomada como um
processo cultural em progressão com recurso à história mais antiga (Lunda) à
história posterior (Cokwe, recurso à dominação colonial (Diamang) recurso ao
presente (pós—
-independência):
Nós os cokwe como os Lundas somos os
mesmos. Nós não nos separamos. Acredito que a colonização tenha feito que a
separação acontecesse e nos dividimos Se os Mianangana
anteriores se dividiram nós hoje estamos à procura de unidade entre nós. É
claro que os Lundas conhecem uma parte devido à forma e à língua como foram
educados. Também tem Cokwe que não conhecem a história deles, como também tem
Lundas que não conhecem a história deles. Numa próxima ocasião nós os mais
velhos que já conhecemos a história vamos explicar: ‘Quem dá não se deve
arranjar intriga com ele’[71].
As trocas, a movimentação e a guerra tornaram mais
fácil a compreensão de um presente que reproduz, transforma e adequa a noção de espaço às necessidades do
quotidiano. A lunda, como as suas diferentes fronteiras transformam-se em
locais abertos a recomposições permanentes, espaço poroso para a troca de
mercadorias, mas também lugar de troca e contaminação das linguagens saberes e
instituições. Antigas legitimidades são lembradas pela memória colectiva quando
se trata de reocupar a terra e recuperar antigos poderes desvalorizados pela
acção da Companhia e pela proclamação de um estado laico e socialista. Os
vazios do poder, as impossibilidades da administração do território foram
preenchidos pelas instituições locais e seus agentes.
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[1] Para um conhecimento das
culturas mais antigas ver J. Desmond Clarck, «Further Paleo – Anthropological
Studies in Northern Lunda», Subsídios
para a História, Arqueologia e Etnografia dos povos da Lunda, Diamang,
Publicações Culturais nº 78, Lisboa, 1968; para um entendimento dessas culturas
no contexto mais geral da Angola Pré-Histórica ver o trabalho de síntese de
Carlos Ervedosa, Arqueologia Angolana, Luanda,
Ministério da Educação, 1980. Para uma nova leitura dos dados e sua
actualização ver Jan Vansina, How
Societies Are Born, Governance in West Central Africa before 1600,
University of Viginia Press, 2004.
[2] Administrativamente
divididas em duas províncias, Lunda Norte e Lunda sul, pelo decreto 84/78 de 4
de Junho de 1978.
[3] Nkalanyi, afluente do Rio
Sankuru (Lubilaci) na Republica Democrática do Congo.
[4] Commonwelth Lunda – Designação proposta por Jan
Vansina para designar o “Império Lunda”: “Os Reinos Lunda não formaram um
império no sentido de reconhecerem uma única chefia do estado, não foram
governados a partir de um centro único e não formaram um simples e coeso
território. É melhor a designação Commonwelth porque muitos dos quase autónomos
centros foram fundados por colonizadores Lunda, que se misturaram com as
populações locais”, Jan Vansina, “It Never happened: Kinguri’s Exodus and it’s
Consequences”, History in Africa
(1998), 411-27. Outros especialistas consideram a Lunda “ uma espécie de
federação comercial e tributária, relativamente coerente e estruturada, cuja
influência se estendia sobre uma vasta área entre o rio Cuango e as entidades
étnicas e políticas Pende e Iaca, na beira do Congo, os Lovar (Luvale) do Alto
Zambeze, mais a sul, e o Cazembe, no rio Luapula, mais a leste. Integrava as
populações linguística e culturalmente distintas dessas regiões através de uma
rede de autoridades e emissários políticos e militares que se identificavam
como «Lundas» adoptando a organização e os símbolos políticos da corte do Muata Yanvo (Mwant Yav)”, Jill Dias, “O Império Africano”, pp.335, 336.
[5] . V. Henrique de Carvalho, Etnhographia e História Tradicional dos Povos da Lunda, Lisboa, p.
63, nota 1.
[6] Ver sobre este assunto, Eduard Bustin, Lunda under Belgian Rule, The Politics of Ethnicity, pp. viii, ix.
[7] Segundo
Bastin: «o chefe de sangue sagrado mulopwe, Chibinda Ilunga introduziu no país
dos Lunda a concepção de organização política dos Lunda do Shaba que repousa na
sacralidade do poder do chefe e no governo do seu estado por intermédio de uma
hierarquia de funcionários», Statuettes Tshokwe du héros civilisateur
“Tshibinda Ilunga, in Arts D’Afrique
Noire, 19, 1976, p.27. O termo Mulopo (muropo) foi usado muitas vezes como
sinónimo de Mwant yav como por exemplo no diário dos pombeiros angolanos Pedro
João Baptista e Amaro José ou Anastácio Francisco no relato da «Viagem de
Angola para os Rios de Senna (1802-1806)», Annaes
Marítimos e Coloniais, Tomo III, Lisboa, 1843. Para uma compreensão das
origens linguísticas da palavra ver Hoover, The
Seduction Of Ruwej: Reconstructing Ruund History (The Nuclear Lunda, Zaire,
Angola, Zâmbia), vol. I, p. 543.
[8] Mwant Yav, rei, imperador.
Carvalho considera o vocábulo composto e sinónimo de “senhor das riquezas,
árvores, rios e pedras, todas as terras, todas as vidas, Ethnographia, p. 74. Título político muito antigo composto a partir
de Senhor e do nome próprio Yav (víbora, serpente). Ver Hoover, Seduction, p. 541.
[9] Ver sobre este assunto
Vansina, How Societies cit., p. 255.
[10]
Henrique de Carvalho publicou um diário detalhado da sua viagem Descripção
da Viagem à Mussumba do Muatiânvua, Lisboa, 4 Vols., 1890-1894; a história
dos diferentes povos Lunda, Ethnographia
e História Tradicional, já citado neste trabalho; Methodo pratico para fallar a Língua da Lunda, contendo narrações
históricas dos vários povos, 1890; A
Lunda ou os Estados do Muatiânvua, domínios da soberania de Portugal,
Lisboa, 1890;Metereologia, Climatologia e
Colonisação. Estudos sobre a região percorrida pela expedição comparados com os
dos beneméritos exploradores Capello e Ivens e de outros observadores nacionaes
e estrangeiros. Modo Practico de fazer
colonisar com vantagem as terras de Angola, 1892; OJagado de Cassange na Província de Angola, 1898.
[11] Rukano, Rukan. Bracelete
de veias humanas distintivo de soberania, o bracelete Lunda símbolo da autoridade
real, (lucano) “são uns braceletes, distintivo que só usam o muatiânvua e Muata
que têm estado. Já o usavam os senhores dos antigos Bungos, honra que depois
Luéji-ia-Conti concedem a todos os Bungos logo que entregou o do pai a Chibinda
Ilunga”, Carvalho, Ethnografia p. 59
e nota 2, 350 e segs., desenho em Ethnografia,
p.112; V. Carvalho Methodo Pratico, p.367; “A jóia do reino, uma pulseira
feita com os dentes dos antepassados, transforma o seu proprietário num ser
semelhante a um deus aos olhos dos negros lunda e faz dele o soberano
incondicional do reino dos Lunda”, Curt Von François (1888), in Heintze, Ethnographishe Aneignungen, p. 273; O
sagrado bracelete real de tecido humano enrolado numa base de ferro,
provavelmente de origem proto-lunda, Hoover, The Sedution, p.529. V. Tb. Heintze, Pioneiros, p.444. Lukanu (variante Cikanu) presente nos cestos de
adivinhação Cokwe. Simboliza as tensões entre os poderes.
[12] Henrique de Carvalho,
cit. pp. 60-91 (Texto com supressões).
[13] Lukano, Rukano,
Rukan, bracelete de veias humanas distintivo de soberania, o bracelete Lunda
símbolo da autoridade real, (lucano) “são uns braceletes, distintivo que só
usam o muatiânvua e Muata que têm estado. Já o usavam os senhores dos antigos
Bungos, honra que Luéji-ia-Conti
entregou a Chibinda Ilunga”, Carvalho, Ethnografia p. 59 e nota 2, 350 e segs., desenho em Ethnografia, p.112; V. Carvalho Methodo
Pratico, p.367; “A jóia do reino, uma pulseira feita com os dentes dos antepassados,
transforma o seu proprietário num ser semelhante a um deus aos olhos dos negros
lunda e faz dele o soberano incondicional do reino dos Lunda”, Curt Von
François (1888), in Heintze,
Ethnographishe Aneignungen, p. 273; O sagrado bracelete real de tecido
humano enrolado numa base de ferro, provavelmente de origem proto-lunda,
Hoover, The Sedution, p.529. V. Tb.
Heintze, Pioneiros, p.444. Lukanu
(variante Cikanu) presente nos cestos de adivinhação Cokwe. Simboliza as
tensões entre os poderes e a sucessão.
[14] Ver crítica em Miller, Poder Político, p. 115 e Hoover, The
Seduction, p. 231, nota 52.
[15] Anangana (mw-; my-) Soba dinástico chefe; rei ou
rainha; também a condição ou estado de (mw ou my) anangana, autoridade própria
do soba dinástico ou a esfera da sua influência; realeza; reino, Barbosa, Dicionário, p. 13. “ Na base da
organização social está a mianangana
conceito de família alargada ou clã. Nas aldeias existe um número variável de mianangana e isto determina a
organização espacial das residências e facilita a gestão da vida comunitária
numa base descentralizada. Contudo há sinais que eles começam a perder alguma
força relativamente aos líderes religiosos” (Estudo de caso efectuado pela
ADRA, na Lunda-Sul em 2004). Ver Hermann Baumann, in Heintze, Ethnographische
Aneignungen. Deutsche Forschungsreisende in Angola. Frankfurt: Lembeck. Versão portuguesa:
Exploradores alemães em Angola:
Apropriações Etnográficas, Lisboa/Luanda: Ed. Caminho/Nzila (no prelo).
[16]
Muyombo ou Myombo o mesmo que Mukumbi Lannea
ambacensis (Hiern), Engl. “O Mukumbi é uma árvore de madeira boa e macia. É
do Mukumbi e da Mulemba (Ficus
Psicolopoga Welw. ex Warb, Ficus Sicomurus, Phyllantus stuhlmannii Pax, Ficus
thoningii Bleim) que os nativos plantam os seus Myombo, árvores protectoras
da aldeia, representando o espírito dos seus ancestrais” diz José Vicente
Martins em Crenças, Adivinhação e Medicina Tradicionais entre o Tutchokwe do
Nordeste de Angola, Lisboa, IICT, 1993, p. 344. O local onde repousam os
espíritos da linhagem, segundo Miller, Poder
Político e Parentesco, Luanda, Arquivo Histórico Nacional de
Angola/Ministério da Cultura, 1995, p. 144.
[17] Cibokwe, lugar de
chegada dos primeiros nobres lunda em litígio com o poder do Mwant Yav, segundo
a tradição. Os exploradores portugueses Capelo e Ivens, no seu livro De Benguela às Terras de Iaca, recolhem
a tradição de Ndumba Ya Tembo, descendente dos “pais fundadores” : Ouvi contar a meus avós que toda esta terra que se
estende ao longo do Cuango de cá e de lá era, noutro tempo, pouco povoada.
Existia já o poderoso governo dos Lundas, e também uma mulher na mesma Lunda,
denominada Tembo ou Lucuoquessa, que tinha três filhos chamados N’Dumba- Tembo,
Muzumbo-Tembo e Cassanje-Tembo, caçadores notáveis, possuindo grandes partidas
de gente, com que vagueavam pelo sertão, perseguindo e matando os animais que
viam no caminho. Questões sérias, porém com o chefe do estado, deram em
resultado a perseguição dos três caçadores, fugindo eles para oeste, com
grandes troços de gente, na intenção de aí se estabelecerem. Abandonaram pois a
Lunda, e, avançando para a margem do Cuango, conquistaram os povos que por ali
se encontravam dispersos, dividindo as terras ente si pela forma como vou
indicar.
N’dumba-Tembo
tomou para si o T’chiboco, tendo por limites ao sul o Cassai, proximamente, ao
oeste o Jombo, ao Norte o Mieji, Ao poente o Cuanza e o Luce por Leste;
Muzumbo-Tembo tomou o Songo, isto é a terra que fica entre o Cuando e
Tala-Mogongo até ao Cuije; Cassanje-Tembo escolheu para si as terras que no
Norte se estendem entre o Cuango e Tala-Mugongo, sob a Denominação de Quembo, Songo
e Holo, passando a chamar-se Jaga delas.
Nas
melhores condições com os povos avassalados, começaram as suas relações,
casando com os filhos destes, e, organizando os estados que hoje conheceis”.
[18] A
proposta é de Hermann Baumann que também chama atenção para o tipo de povoado
entre os Cokwe, sucessivamente modificado e adaptado às condições do ambiente
(a floresta ou a chana). Mazwo, Zwo, Casa, habitação de construção sólida entre
os Cokwe, Baumann, Ethnographische
Aneignungen, Trad. Portuguesa, (no prelo), Segundo João Vicente Martins, Elementos de Gramática UtchoKwe, p. 232,
Nzuo, Pl. Mazuo é casa, em geral para os Cokwe. Nzo é ainda a grafia referida
por MacGaffey para casa em certas regiões de língua kikongo.
[19] Usoko-
s., parente, amigo, conterrâneo, João Vicente Martins, Elementos de Gramática de Utchokwe, p. 222. O mais importante
núcleo da sociedade Cokwe, a matrilinhagem mínima de quatro gerações. Grupo de
adultos ligados por laços de sangue, irmãos e irmãs, à sua mãe. Consiste num
pequeno grupo de parentes (irmãos e irmãs) adultos, agregados em torno de uma
mãe (no caso de ainda ser viva), e da sua descendência matrilinear. Os filhos
das irmãs, mas não os seus maridos, pertencem ao usoko. Esta estrutura mais ou menos rígida e a sua implicação na
sociedade cokwe pode ser acompanhada e percebida através do estudo do ciclo de
vida de uma criança cokwe.”V. Miller,
Cokwe Expansion, 1850-1900,
Occasional Paper nº 1, African Studies Program, The University of Wisconsin
Madison, Wisconsin 53706, Spring 1969, second printing, p.6
[20] Para uma abordagem mais
profunda deste assunto ver Jill Dias, “Angola” in Império Africano, Vol. X, Lisboa, Editorial Estampa, 1999,
especialmente pp.331, 332 e Joseph Miller, Way
of Death, London, James Currey, 1988, p. 43. Os depoimentos recolhidos no
campo (Lunda-Norte e Lunda-Sul) em 2003 confirmam que a memória colectiva
mantém a importância do trabalho das mulheres na recolha e tratamento da cera e
da borracha.
[21] de Kanda (mu-;
mi-), unir, “Rito da iniciação masculina ou da circuncisão; Recinto onde
decorre aquele rito; função ou actividade do nganga-mukànda ou o conjunto de
utensílios que caracterizam aquela função”, Adriano Barbosa, Dicionário, p.
158; «Os rapazes dos sete para os oito anos, e as raparigas antes da puberdade
são circuncidados, e depois dessa cerimónia os rapazes tomam um outro nome, que
muitos substituem ao de leite... São os pais que entregam os rapazes naquela
idade a um anganga da especialidade para a cerimónia da circuncisão que dura de
uma determinda lua a outra. O anganga, tomando conta deles, leva-os para uma
casa distante da povoação a que chamam mucanda,
e onde eles se conservam em liberdade com os companheiros mas não tendo
relações algumas com o exterior... A esta cerimónia chamam eles cata mugongue e faz-se sempre a um grupo
de rapazes a que chamam mucanda de tal época... Em toda a região da Lunda
ninguém pode ser senhor de Estado sem ter passado por essa operação”, Carvalho,
Ethnographia..., p. 448; “ritos de
passagem masculinos, termo comum aos Quiocos, Lundas, Luenas, Chinjes,
Minungos, etc”, Redinha, Etnossociologia
do Nordeste de Angola, p. 98. Na consolidação do poder Cokwe, laços
adicionais estabelecem-se entre indivíduos provenientes de diferentes aldeias
através da mukanda. Cada mukanda inclui membros de diferentes linhagens, que
assim, depois da cerimónia de iniciação, estabelecem entre si uma espécie de
irmandade, baseada em laços de sangue e as ligações forjadas na Mukanda
estendem a rede das relações entre as aldeias de onde são provenientes. V
Miller, Cokwe Expansion, p. 12.
Associação, derivada do proto-bantu gandá
(mesmo radical de Nganda. Nas línguas
Lweta significa associação. Noutros
sítios (Lunda, Sudoeste de Angola (Mbunda, Nyemba, Luchazi), significa a
iniciação masculina, Vansina, “Governement...”, p. 13
[22] Em
1881 Von Wissemann dá conta das mudanças de estratégia e da fundação de um novo
caminho de comércio em cuja duração ele não acredita.
[23] V. Georges Balandier, Anthropologie politique, Paris ,
P.U.F., 1967, p. 221,222.
[24] Miller, Poder Político, p.136, « O relato
seguinte conhecido numa corte menor dos Cokwe em 1903/ 1904, ao qual,
presumivelmente, foi acrescentada informação tardia obtida dos chefes vizinhos
Lukazi. A corte Cokwe afirma que Tembua Tchissengue caiu do céu no território
do Mwant Yav e deixou cinco filhos e uma filha, os antepassados dos grandes
chefes Cokwe», Vansina, “It Never happened...”, p. 395.
[25] Idem p.93 e nota 1.
[26] Na tradição dos lusona (desenhos na areia) Cisengue
(Mwatcisengue) é o chefe mais conhecido e representado, Mário Fontinha, Desenhos na areia..., p.28.
[27] Previsto e aprovado por
ministros das colónias como Louis Franck (1918-1924)
[28] Ver sobre este assunto Edouard
Bustin, Lunda under Belgian Rule, pp.
65-98
[29] V. David Gordon, “Owners of The Land”, pp 324,
325
[30]
Idem, p. 331. As relações do poder colonial com o poder tradicional nas colónias britânicas
resultaram do facto dos interesses mineiros nunca terem sido ameaçados, pela
presença dos diferentes Mwata Kazembe, reconhecidos pelos poderes coloniais.
[31] J.
Pereira do Nascimento/A. Alexandre de
Mattos, A Colonisação de Angola,p.32.
[32] Ver
sobre este assunto Maria da Conceição Neto, “Respeitar o Passado- e não
regressar ao passado. Contribuição ao debate sobre a Autoridade Tradicional em
Angola, 1º Encontro sobre a Autoridade
tradicional em Angola, Luanda, MAT, 2003, especialmente p.183. A alteração
da situação só ocorre a partir dos anos sessenta do século XX, devido ao início
das lutas de libertação nacional e a pressões internacionais, nomeadamente da
OIT, Organização, Internacional do Trabalho.
[33] Chefe, a partir do kimbundu usóba, autoridade, poder, Cf. Cordeiro da Matta, Ensaio, p. 151 e também Maia, Dicionário, p. 488. Beatrix Heintze
refere em Fontes... tratar-se de um
título político dos mbundu, já referido nos documentos antigos sobre Angola.
Heli Chatelain afirma que o título de Chefe em
Quimbundo é geralmente soba, Cf, Contos,p.
81. Óscar Ribas, Dicionário...p. 272
averba para soba «autoridade suprema de
uma tribo africana, Régulo». Adriano Barbosa, no Dicionário Cokwe – Português,
p. 526, averba «soma- soba, régulo ou chefe de uma aldeia (vocábulo umbundu
usado por vezes no quioco (sic) para designar o régulo ou soba subalterno do
(Mw)anangana», Em Miller, Poder
Político..., pp.194,195, 215, nota 120, 231, soba é sinónimo de título
político e usado para designar titulares autóctones. Virgílio Coelho, em “A
Questão do Controlo da Terra...”, p. 197, sublinha que «sobado é um termo
híbrido que na língua portuguesa tem sido utilizado para nomear a terra ou
lugar e localidade que geralmente é dirigido por um chefe político cuja
designação é sóbà». Define “Jísòbá, como o detentor dos símbolos do poder confeccionados
em ferro em contraponto com os Ílàmbá, senhores da terra. A literatura e a
administração coloniais rasuram muitas vezes as complexas hierarquias entre os
diferentes chefes africanos e consequentemente a diferente terminologia que os
designa. A ideia de soba foi a que prevaleceu mesmo quando a legislação acorda
que «autoridades gentílicas são os sobas, sobetas, séculos, macotas,
mucuruntos, lengas e similares», Cf. Ferreira Diniz, Populações Indígenas de Angola, p. 659, considerando assim soba como
a autoridade máxima reconhecida, ver sobre este assunto Rodrigues de Areia, “A
Etnização da África...”, p. 380. Mesmo para regiões com outras formas de
designar os portadores de títulos políticos “Mwata” de Mwâ:nt-chefe, “Grande do
Estado”(Carvalho, Methodo, p. 365 e Ethnografia... p.74, nota 1) a palavra
soba generalizou-se, ocorrendo por vezes a repetição de títulos. Ver a título
de exemplo “soba Xá Tchisengue” na documentação da Companhia de Diamantes.
[34] Entrevista (1ª) a
Felizardo Gourgel, realizada no Dundo Lunda- Norte em 18-11-2002.
[36]
Jean- Luc Vellut refere apoiando-se na tradição Samba esse tempo, V. Questions Speciales D’histoire de L’Afrique,
p. 34.
[37] Para usar um conceito
proposto por Jérôme Bachet,”L’Histoire Face au
Présent Perpéctuel”, p. 57.
[38] V. Margareth Read, “Les
Migrations de Travailleus en Afrique “,p. 684
[39] Marc
Auge, Não-Lugares, p. 53.
[40] Archives du Ministére des
Affaires Étrangères, AIMO, doc. E/6
[41] Em
Angola como Governador de 1812
a 1915 e como Alto – Comissário de 1921 (nomeação de
1920) a 1924. A
ele se devem os diplomas de concessão outorgados à companhia de Diamantes de
Angola- Diamang.
[42] Archives M.A.E, AIMO, doc
E/6.
[43]
Formada como agência recrutadora de mãode obra, com fins não lucrativos,
legalmente independente da “Chamber of Mines” mas sob o seu controlo político. V. sobre este assunto V.L. Allen, The Story, Vol I, pp. 157, 158. A formação, no Katanga, da Bourse du
Travail du Katanga (BTK) inspira-se no modelo Sul- Africano.
[44] Vide nota 5.
[45] V.
Halbwachs, La Memoire Collective ,
sobretudo o capítulo 2.
[46]
Vulgarmente grafado na bibliografia Tsikapa, ou Tshicapa, ou na documentação
portuguesa Chicapa. A bacia hidrográfica das Lundas tem um dos seus nós
fundamentais no Alto Cikapa, de cota igual ou superior a 1300 m . Aí nascem os rios
mais importantes : Kuango, Kuílo, Luangue, Cikapa, Luachimo, Ciumbe e Kassai.
Esta rede fluvial terá influenciado e de certa maneira intensificado as
sucessivas migrações de povos desde a pré-história, Vide Jan Vansina, Introdution a l’Etnhographie du Congo, Kinshasa,
Université Lovanium, 1966 . Para a caracterização hidrográfica da região ver
Relatório elaborado por Pinto Moura, “Estrutura Física da Lunda”, sd, relatório
dactilografado.
[47] Forminiére- Société Internationale
Forestiére et Miniére du Congo, criada pelo rei Leopoldo da Bélgica em 1906.
Companhia ligada à Societé Génerale de Belgique.
[48] A
criação da Pema é discutida no Conselho de direcção da Société Générale de 23
de Julho de 1912: ”Monsieur Jadot expose un project de constitution d’une
Compagnie Portugaise dite Cie de Recherches Miniéres à L’Angola e fait
connaitre les raisons qui ont determiné cette creation. [48] São
sócios fundadores da PEMA O Banco Nacional Ultramarino, a firma Henry Burnay
& C.ª (mais tarde Banco Burnay),-Portugal; a Société Génerale de Belgique,
a Mutualité Coloniale-Bélgica; a Banque de L’Union Parisienne – França e o
Grupo Ryan- Guggennheim-Estados Unidos da América
[49] O
distrito da Lunda é criado por decreto de 13 de Junho de 1895, sendo seu
governador Henrique de Carvalho. Este decreto fixava como limites N e L as
fronteiras com o Congo (Estado livre) e O e S os rios Kwango e Kasai. Como
directiva para a ocupação que ela se fizesse a N por Kasanje e a S por Mona
Quimbumdo. A sede do distrito seria Capemba Camulemba. As disposições do
decreto ficariam dependentes da ocupação militar e Malange continuou a ser a
sede do distrito. Este decreto seria sucessivamente modificado em 1907 e em 27
de Maio de 18917 (aplicação a Angola do regime das circunscrições
administrativas) a ainda pela portaria provincial de 17 de Abril de 1913, pela
portaria nº 144 de 11 de Junho de 1918, pelo decreto nº 3 365 de 15 de Setembro
de 1917 e pela portaria nº 150 de 21 de Junho de 1918 (divide a Lunda em cinco
capitanias –mores: Camaxilo, Cuilo-Chicapa. Minungo, Cassai Norte e Cassai-Sul.
O decreto nº 292 (B.O. nº 21- 1ª série, 12 de Maio, 1923, p. 25) divide o
distrito em : “ uma circunscrição de fronteira,denominada Chitato; e seis circunscrições
civis denominadas Camaxilo, Cuilo-Chicapa, Cassai-Norte, Saurimo, Cassai-Sul e
Minungo.
[50] Como
refere Bustin, cit, p. 44, «de 23 grandes campanhas de pacificação ocorridas no
Kassai entre 1893 e 1911, pelo menos 10 foram dirigidas contra os Cokwe. A
missão de prospecção de 1912, chefiada pelos engenheiros Decker e Newport, ao
serviço da Forminiére foi impedida pelo chefe Kalendende.
[51] Ver sobre este assunto e
para o caso de Angola a análise em Ruy Duarte de Carvalho, “Guerra, Paz, Violência Estrutural
e Desenvolvimento” em A Câmara , A Escrita e a Coisa Dita...Fitas, Textos e Palestras, Luanda, Inald- Instituto Nacional do Livro e do Disco,
1997, p.98.
[52] Ruy Duarte de Carvalho,
cit, p. 99.
[53] Os fundamentos de um tipo especial de exploração são lançados
com a criação da companhia, “portuguesa” (artigo 2º dos estatutos) e com um
capital social fornecido em Portugal pelo Banco Nacional Ultramarino, e Henry
Burnay e Cie.; na Bélgica a Société Générale e a sua associada a Société
Internationale Forestière et Minière du Congo (Forminiére); em França O Banque de
L’Union Parisienne; na Republica da África do Sul a Anglo American Corporation;
e, nos Estados Unidos da América, o grupo Ryan- Guggenheim. Os estatutos da
Companhia de Diamantes de Angola, DIAMANG são publicados no Diário do governo, II Série,nº 136, de 12 de Junho de 1918 e Boletim Oficial da Província de Angola,
II série, nº 27 de 6 de Julho de 1918
[54] Como se pode ver em Bill Freund , “Labour
and Labour History”, p. 2.
[55]
Relatório do Representante da Companhia de Diamantes em Angola em 1929, MUC,
Cx, 202.
[56]
Desde 29 de Abril de 1875 que a produção legislativa, abundante a partir dessa
época, prevê o mecanismo do contrato, tendo o regulamento de 1899 (Decreto de 9
de Novembro de 1899) consagrado a obrigatoriedade do trabalho no seu artigo 1º:
“Todos os nativos das províncias ultramarinas estão sujeitos à obrigação legal
e moral de trabalhar, podendo escolher o meio de cumprirem esta obrigação...” “
se não cumprirem de modo algum a autoridade pública poderá impor-lhes o seu
cumprimento”. Em 1902 o Regulamento Provisório do Trabalho Indígena e Fomento
agrícola de Angola não altera estes princípios. Nem mesmo as leis e
regulamentos publicadas depois da Implantação da Republica alteram estas
disposições. Ver Decreto de 27 de Maio de 1911 e o Regulamento Geral do
Trabalho dos indígenas nas Colónias Portuguesas de 14 de Outubro de 1914. Um
corpus legislativo produzido na província e contendo várias disposições
referentes à mão- de- obra ‘indígena’ regula e permite os procedimentos no que
se refere ao angariamento e recrutamento de trabalhadores.
[57] Em
1924 chegam à Lunda 2000 trabalhadores provenientes do Moxico e cerca de 300
originários de Benguela, Bié e Huila, Acta da 51º sessão do Conselho de administração
realizada no dia 29 de Julho de 1924.
[58]
“Chez les indigènes, l’etát sanitaire reste peu favorable. Les maladies le plus
fréquement constatées sont: le paludisme, les affections intestinales, les
affections pulmonaires et une énorme quantité d’ulceres des members
inférieures, la plupart du type phagédémique à marche rapide. La sous –
alimentation est la cause principale du manqué de resistence des travailleurs”,
SPE, Rapport de la
Direction Tecnhique de 1932.
[59] O
índice de Pignet calculava-se subtraindo da altura em centímetros a soma do
peso em quilos e do perímetro torácico em centímetros. Essa
fórmula permitiu a criação de uma escala que determinava o índice de robustez e
logo a aptidão dos trabalhadores para o serviço.V. R. Mouchet e R. Van Nitsen, La Main - D’Oeuvre Indigène, pp.3,4. V. Tb. A.
A. Almeida e Sousa, O Índice de
Pignet..., passim.
[60] Acta
da 47ª Sessão do Conselho de Administração, 26 de Dezembro de 1923, Fundo SPE,
cx 40. Note-se que o decreto nº 41 de 3 de Agosto de 1920, do governo Norton de
Matos regulava o fornecimento de alimentação e sabão aos trabalhadores
consignando no seu artigo 6º alínea d) que a dieta tinha que conter 700gr de
fuba, 300gr de feijão (podendo este ser substituído por 150 gr de arroz ou 600gr de
batata doce), 250 gr
de carne (podendo alternar 4 vezes por semana com 300 gr de peixe), 50 g de azeite de palma e 30 g de sal, por dia.
Considerada medida pesada pela Companhia foi negociado entre o representante da
Companhia e o governador de Malanje, um “modus vivendi depois aprovado pelo
Alto Comissário, em que a par da solução de outras questões importantes, se
define também a forma da Companhia satisfazer, dentro dos limitados recursos
locais, as pesadas disposições regulamentares relativas à alimentação e higiene
dos indígenas empregados nas explorações mineiras” Relatório do Conselho de
Administração relativo ao ano de 1922. O diploma legislativo nº 670, BO nº 50, 1ª série de 15 de Dezembro de
1927, publicado pelo Alto-comissário Vicente Ferreira altera as disposições do
anterior diploma Norton de Matos. Ao não tabelar as quantidades dos diferentes
elementos fixados na dieta, permite às Companhias privadas uma maior margem de
manobra no que toca à alimentação dos trabalhadores.
[61] Os
estudos levados a cabo nas regiões mineiras do Congo Belga são conhecidos.
Alguns médicos belgas visitam a Diamang. A ideia do papel do “médico
industrial” cujo papel deve ser “sem abandonar o ideal fundamental da sua
profissão, organizar um serviço no interesse da empresa que o emprega” e que
portanto a sua actividade se deve pautar seguindo os eixos da higiene e
profilaxia no trabalho e a gestão económica”, cf. R. Mouchet e R van Nitsen, la Main d’Oeuvre, p. 203. O estudo aponta a
constituição das rações alimentares regulamentadas desde 1930 e com a seguinte
composição :
(Ração/dia)
Proteínas....................................100 g.
Gorduras... ................................ 75 g .
Hidratos de carbono............... 600 g .
Legumes ou frutos frescos..... 150 g .
Sal............................................... 15
g .
Do trabalho ressalta ainda
a grande liberdade do médico em compor as rações e a possibilidade de as
ajustar ao gosto e hábitos alimentares dos ‘indígenas’ e a partir de uma
composição base, estudam outras situações noutras regiões mineiras de África,
V. Mouchet e Nitsen, cit., pp.223,235.
A título de informação registamos que um dos autores deste trabalho visita a
Diamang.
[62] Ver
circular 5 de 17/1/41, de 16/12 de 41; Telegrama de 17/12/41, do Dundo para
Luanda (recebidas 100 famílias mucubais. Não desejamos mais(sic); Relação dos
indígenas mucubais chegados ao Dundo, 23/2/42, Fundo SPE, Diversos, Mão de Obra
Indígena, Dossier 1941/1942. “A guerra de 1940-41, que é a última e a
definitiva destas diligências, utilizou cerca de mil soldados... Durou 5 meses,
comportou execuções em massa e atrocidades contra prisioneiros... Fez mais de
3500 prisioneiros que depois remeteu às Ilhas de S. Tomé e do Príncipe, à
Lunda, onde trabalharam para a Diamang...”, Ruy Duarte de Carvalho, Aviso..., p. 22.
[63]
Cunha Leal elabora alguns textos, mais tarde reunidos em livro, Coisas do Tempo Presente, Coisas da
Companhia de Diamantes de Angola (DIAMANG), Ed. Do Autor, 2 Vols.
Respectivamente de 1957 e 1959, contra os privilégios da companhia e contra a
gestão de Ernesto de Vilhena. Alguns Jornais da então Província de Angola fazem
eco de algumas vozes que se afirmam contra a Companhia.
[64] Gilberto Freyre, Aventura e Rotina, Lisboa, Livros do
Brasil, [1954], pp. 350, 351
[65] Ernesto Vilhena, Aventura e Rotina, Crítica de uma Crítica,
p. 7
[66]
Idem, p, 18. Ver sobre este assunto Cláudia Castelo, «O Modo Português de Estar No Mundo, O luso-tropicalismo e a ideologia
tropical portuguesa(1933-1961),pp. 93, 94, 95. Para uma visão alargada da
discussão sobre o conceito Lusotropicalismo v. Lusotopie, 1997, especialmente o capítulo “Lusotropicalisme,
Ideologies Coloniales et Identités nationales dans les mondes Lusophones”, p.
195-377.
[67] O primeiro trabalho de
busca e aquisição das peças data de 1936 e foi efectuado nos arredores do
Dundo, Relatório do Conservador do Museu José Redinha, de 22 de Setembro de
1945.
[68] Endiama
[69] V. Filip De Boeck, “Comment Dompter
Diamants et Dollars: Dépense, Partage et Identité au Sud-oest du
Zaїre(1980-1997) in Chasse au Diamant au
Congo/ Zaїre, Larent Monnier/ Bogumil Jewiewicki et Gauthier de Villers
(dir.), Cahiers Africains, 45-46,
Institut Africain-CEDAF/Harmattan, Tervuren/Paris, 2000, pp.172-208.
[70] Informações recolhidas no
trabalho de campo em 2001, 2002 e 2003.
[71] Leonardo Kojo, Lunda
–Norte, entrevista de 2001.
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