A fronteira de Angola


Quinta-feira, 29 de Agosto de 1901

Acordo sobre a delimitação da fronteira de Angola
00111

Portugal e a Inglaterra chegam a acordo sobre a delimitação da fronteira de Angola, na sequência dos acordos de 1891. Ainda assim, a questão das fronteiras de Angola só estará fixada na década de 20. A norte, apesar da Convenção com o Estado Independente do Congo de Maio de 1890, esta questão só fica tratada, já na República, pela 4.ª Convenção do Lobito: Portugal cede parte da região de M’Pozo e recebe territórios na zona do Cassai. O Convénio luso-inglês de 11 de Junho de 1891, resolvera o traçado da fronteira com Rodésia do Norte mas deixara por delimitar o Barotze. Em Agosto de 1903, Portugal e a Grã-Bretanha estabelecem as bases da arbitragem na questão do reino Barotze, deferida ao julgamento do Rei de Itália. A sentença arbitral é de Maio de 1905, a que se seguirá o protocolo de 1915 para demarcação da fronteira de Angola e da Rodésia, descrita na sentença arbitral como reino Barotze. A República teria problemas com as fronteiras sudoeste, nomeadamente por causa de um litígio com a Alemanha. Esta colónia, depois da I Guerra Mundial, passará a estar sob mandato da União da África do Sul, sendo fixada a respectiva fronteira pelas conferências de 1920 e 1926. Em Junho de 1926, é feito e assinado na cidade do Cabo, um acordo entre o governo da República Portuguesa e o da União da África do Sul respeitante à linha da fronteira entre a província e o território do sudoeste de África, sob mandato. A delimitação de fronteiras do que ficou a ser o Enclave de Cabinda decorreu do Acto de Berlim de 1885 e de posteriores convénios com a França e Congo.



De acordo com Oliveira, a Inglaterra contestava a soberania portuguesa nos territórios ocidentais de África entre os paralelos 5º 12’ e 8º latitude Sul, ou seja, entre a margem direita do rio Zaire e o sul de Ambriz. Estas objeções colidiam com o Tratado assinado entre estas duas partes em Julho de 1817 que defendia como territórios “efectivamente possuídos” todos os que estavam compreendidos entre o paralelo 18º e 8º latitude Sul. Nestes estavam incluídos os de Molembo e de Cabinda, que iam do paralelo 5º 12’ e 8º latitude Sul. Só que este Tratado colocava os ditos territórios de Molembo e Cabinda na Costa Oriental de África, facto que provocou claros dissabores à diplomacia portuguesa. Este verbal mistake, como ficou depois consagrado nas relações luso-britânicas, só foi regularizado pela convenção adicional de Abril de 1819 (Oliveira, 2010).
26Todavia, deve-se recordar que os territórios portugueses, pela convenção de Madrid de 1786, tinham início no paralelo 0º 36’, ou seja desde o Cabo Lopo Gonçalves – Lopez Cap, nas cartas inglesas – e não nos paralelos indicados pelos britânicos e que foram, habilmente, aproveitados pela França quando reconheceu como direitos soberanos de Portugal todos os territórios até Chiloango, ou seja, até ao citado paralelo 5º 12’.
27Esta situação só ficou regularizada num acordo, denominado Questão do Zaire, assinado entre Portugal e Inglaterra em Fevereiro de 1884, onde ficou consagrado que esta reconhecia os direitos históricos de Portugal e o exercício, em benefício da Inglaterra e de Portugal, de um poder exclusivo de polícia e fiscalização no curso superior do Zaire e todos os territórios adjacentes. Este acordo seria fortemente contestado por franceses, germânicos, holandeses, espanhóis e norte-americanos.
  • 6 Boletim Oficial de Angola, nº 42/1883, pp. 733-735.
28Ao mesmo tempo que Portugal dirimia as suas posições geográficas na região com os britânicos, franceses e, mais tarde, com os belgas, os representantes portugueses na região procuravam celebrar acordos com os régulos e príncipes locais, nomeadamente com Tali-e-Tali, Regente do Reino de Kakongo (Cacongo), Mancoche de Muba, Rei do Encoche Luango, António Tiaba da Costa, Regente do Reino de Chinchôcho e representante da Rainha Samano, príncipe Mansange, do Massabe, Mangoge-Bembo da Costa, de Tenda, príncipe Mamimbache, do Kakongo e Mangoal, Regente do Mambuco, e seus sucessores, bem como os mais chefes dos territórios que do rio Massabe se estendem até Malembo, na costa ocidental de África. Destes singulares acordos resultou o Tratado de Chinfuma6, celebrado e assinado a 29 de Setembro de 1883, no morro do mesmo nome, a norte do rio Chiloango. O local foi escolhido porque só por si corroborava o alcance do acordo. Assim, ficaram estabelecidos o protectorado e a soberania de Portugal sobre todos os territórios que se estendem do rio Massabi até ao Malembo, ou seja, os territórios de Lândana, Chinchôcho e Massabe.
29Foram celebrantes, com assinatura e sinalização, do documento, além dos já citados, Brito Cappelo, os oficiais portugueses Cristiano Frederico Krusse Gomes, 1º tenente da armada, e Aquiles de Almeida Navarro, facultativo naval de 1ª classe, e mais cerca de 45 dignitários regionais (entre príncipes, cavalheiros, chefes e governadores) autenticados e certificados presencialmente por João José Rodrigues Leitão Sobrinho, negociante em Lândana, e testemunhado pelo comandante Robert F. Hammick, da canhoneira inglesa Flirt, e R. E. Demet, gerente da casa Hatton & Cookson.
30Portugal, de acordo com o articulado do documento, comprometia-se a garantir a continuidade e integridade das áreas bem especificadas no âmbito do protectorado (Artigo 3º do Tratado de Chinfuma), situação corroborada também pelo auto de posse que foi autenticado pelo rei do Cacongo.
  • 7 Boletim Oficial de Angola, nº 6/1885, pp. 81-86. Outros documentos dão como data da assinatura do T (...)
31Pouco mais de um ano depois, a 26 de Dezembro de 1884, outros responsáveis da hierarquia social e política dos povos de Caio Chimisi, Suangili Mando, Buamongo, Guamongo, Chicambo Naeba e N’cula, consideraram favorável o Tratado de Chifuma, até então encarado como já tendo dado frutos no sentido da defesa dos interesses dos povos da região cabinda das margens da lagoa do Caio, e decidiram apostar na mesma estratégia, assinando, então, o Tratado de Chicambo7, uma cópia fiel do de Chinfuma.
32Mau grado estes Tratados e todas as garantias dadas pelas autoridades portuguesas em matéria de segurança, os cabindas continuavam a sentir-se sem segurança e sujeitos aos mesmos perigos protagonizados pelas outras potências coloniais. Confrontado com esta realidade que, inclusive, poderia levar a uma espécie de rebelião que anulasse os acordos anteriores, Portugal resolveu, com a anuência de um maior número de líderes de Cabinda, avançar para um outro Tratado mais amplo e abrangente que englobasse os anteriores e lhes desse outras mais-valias. Foi assim que, em 1 de Fevereiro de 18858, nasceu o Tratado de Simulambuco9, assinado por Brito Capello, representando o reino português, e por príncipes, régulos e governadores locais representando o Reino de N’Goyo.

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